Um advogado de Salvador está sob investigação de uma falsificação de um habeas corpus do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O caso veio à tona após um ofício do juiz Waldir Viana Ribeiro Júnior, da Vara dos Feitos Relativos a Delitos de Organização Criminosa (VOCRIM) de Salvador, à Delegacia de Crimes Contra a Fé Pública. O documento requisita a instauração de inquérito policial para apurar a conduta do advogado Antonio Jorge Santos Junior, inscrito na OAB/BA sob o número 37082.
O advogado Antonio Jorge Santos Junior, atua como defensor de Averaldo Ferreira da Silva Filho, conhecido Averaldinho, líder do tráfico nos bairros do Calabar e Alto das Pombas. Segundo um documento, ele protocolou uma petição nos autos do processo, solicitando a juntada do suposto acórdão do STJ, alegando que o documento concedia uma ordem de liberdade em favor de seu cliente e, consequentemente, pedia a expedição de alvará de soltura.
A petição continha a seguinte afirmação do advogado: "Averaldo Ferreira da Silva Filho, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, por intermédio de seu advogado infrafirmado, vem a presença de Vossa Exa., requerer a juntada do acordão em anexo expedido pelo Superior Tribunal de Justiça, sendo certificada sua autenticidade e expedido o alvará de soltura do acusado, visto a concessão da ordem de Habeas Corpus por aquele Tribunal Superior."
O documento eletrônico anexado à petição apresentava características de um acórdão legítimo, incluindo número do processo, nome do relator, que seria o ministro Og Fernandes.
O Juiz Waldir Viana Ribeiro Júnior utilizou o caso para fazer um alerta a seus colegas magistrados. Em mensagem interna, ele destacou a gravidade da situação:
Bom dia, colegas. Faço um alerta sobre uma grave situação ocorrida aqui na VOCRIM. Um advogado juntou um acórdão falso, do STJ, requerendo expedição de alvará de soltura. Uma falsificação bem feita. Como meu procedimento nesses casos sempre é determinar que se aguarde a comunicação formal do julgamento pelo Tribunal, não conseguiram o desejado. Passados alguns dias sem vir nada do STJ, meu diretor estranhou e contactou a secretaria da Turma. Não existia nem o HC e muito menos acórdão”, escreveu o juiz na mensagem.
A conduta preventiva do juiz foi importante para evitar que a suposta fraude fosse bem-sucedida. No dia 22 de julho de 2025, o diretor da Secretaria do Juízo certificou que o Superior Tribunal de Justiça informou a inexistência da decisão apresentada pelo advogado nos autos..
A conduta do advogado é, em tese, enquadrável no artigo 297 do Código Penal Brasileiro, que tipifica a falsificação de documento público, crime que é passível de ação penal pública e incondicionada.
Em seu despacho, datado de 23 de julho de 2025, o magistrado requisitou à Delegacia dos Crimes Econômicos e Contra a Administração Pública (DECECAP) a imediata instauração de inquérito para apurar a autoria e materialidade delitiva do crime. Uma cópia integral dos autos do processo com os documentos pertinentes, foi anexada ao ofício. O caso agora segue para investigação policial, que deverá determinar se houve, de fato, a falsificação do documento e a responsabilidade do advogado no ocorrido.
Outro lado da história
O advogado Antonio Jorge Santos Junior, acusado de suposta falsificação de um acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), apresentou sua versão dos fatos em uma petição recente. Em sua defesa, Antonio Jorge alegou ter sido surpreendido pela decisão inautêntica e apontou o antigo patrono de seu cliente, como o possível responsável pela falsificação.
Em sua petição de defesa, protocolada em 23 de julho de 2025, o advogado detalha os acontecimentos sob sua ótica. Ele afirma ter sido "surpreendido em meados do mês de maio do corrente ano com a informação passada por terceiros que o Superior Tribunal de Justica teria revogado a prisão preventiva decretada em desfavor do mesmo".
Segundo Antonio Jorge, o suposto habeas corpus teria sido impetrado pelo antigo advogado de Averaldo Ferreira da Silva Filho, que atuou no início da instrução do processo. Antonio Jorge relata que o advogado teria enviado a decisão para o WhatsApp de parentes do requerente, "cobrando incisivamente os honorários pelo 'trabalho realizado'".
Ele enfatiza que a decisão lhe foi passada como "verídica", mas que, desde o primeiro momento, ele próprio requereu que sua autenticidade fosse certificada. Ele destacou a estranheza de a decisão, datada de 5 de maio de 2025, não ter tido comunicação oficial do STJ até a data da juntada aos autos, em 8 de maio de 2025, algo que "nunca visto antes", gerando "desconfiança deste causídico".
Como prova de sua preocupação com a autenticidade, Antonio Jorge Santos Junior anexou e-mails enviados ao gabinete do Ministro Og Fernandes, relator do suposto acórdão, nos quais pedia informações sobre a veracidade da decisão em 14 de maio de 2025. Ele justificou a dificuldade de acesso à decisão pelo fato de o habeas corpus estaria em segredo de justiça, o que impedia seu acesso sem que fosse o próprio subscritor do mandamus.
Diante dos fatos, ele informou:
Se houve qualquer falsificação esta partiu tão somente do antigo patrono do acusado, sem anuência do mesmo e com total desconhecimento deste patrono que teve a infelicidade de juntar aos autos, visto que jamais viu uma situação como essa em mais de 10 anos de vivência na advocacia criminal”.
Ele ainda frisou que "tudo foi feito às escusas do acusado e sem qualquer conhecimento deste defensor, conforme comprova os prints ora juntados". Ele também pediu que sejam adotadas providências contra o primeiro advogado do caso.
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