Nesta
 terça-feira (22), jornalistas baianos divulgaram uma carta aberta 
repudiando os abusos cometidos por programas policialescos na Bahia. A 
nota foi emitida após reportagem do "Brasil Urgente" com a repórter 
Mirella Cunha, da Band-BA, ganhar repercussão nacional nas redes 
sociais.  
 No
 vídeo, Mirella entrevista um jovem negro que acabara de ser preso 
acusado de assalto e estupro. No vídeo, o jovem assume o assalto, mas 
quando diz que não houve estupro, a repórter afirma ele “queria 
estuprar”.
 Na
 sequência da matéria, o jovem nega várias vezes o crime e pede para a 
vítima fazer o exame para provar sua inocência. Confuso, ele solicita 
que façam o exame de "próstata" em vez de corpo de delito. Mirella Cunha
 ainda chama o detido de estuprador e tira sarro pelo fato dele não 
saber ao certo para que serve o exame.
 Diversos
 blogs e jornalistas repudiaram a atitude da repórter da Band. Agora, 
profissionais da imprensa baiana rechaçam a atitude da jornalista em 
nota oficial. A iniciativa dos jornalistas reflete a indignação com 
"atos comumente praticados por programas noticiosos no Estado da Bahia".
 De
 acordo com o texto, "provoca a indignação dos jornalistas 
abaixo-assinados e motiva questionamentos sobre a conivência do Estado 
com repórteres antiéticos, que têm livre acesso a delegacias para 
violentar os direitos individuais dos presos, quando não transmitem (com
 truculência e sensacionalismo) as ações policiais em bairros populares 
da região metropolitana de Salvador".
 A
 nota ainda retoma o artigo 6º do Código de Ética dos Jornalistas 
Brasileiros que diz que "é dever do jornalista: opor-se ao arbítrio, ao 
autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na
 Declaração Universal dos Direitos Humanos". Para os jornalistas, "o 
direito à liberdade de expressão não se sobrepõe ao direito que qualquer
 cidadão tem de não ser execrado na TV, ainda que seja suspeito de ter 
cometido um crime".
 Além
 disso, os autores da carta ressaltam que a responsabilidade dos abusos 
comumente cometidos no Estado não são apenas dos repórteres, mas também 
dos produtores do programa, da direção da emissora e de seus 
anunciantes.
 Por
 fim, o documento pede aos órgãos competentes que acompanhem o caso e 
garantam que o acusado tenha seus direitos garantidos e seja julgado com
 imparcialidade.
 Acompanhe o texto na íntegra:
 Carta aberta de jornalistas sobre abusos de programas policialescos na Bahia
 "O demo a viver se exponha,
 Por mais que a fama a exalta,
 Numa cidade onde falta
 Verdade, honra, vergonha."
 (Gregório de Mattos e Guerra)
   Ao governador do Estado da Bahia, Jaques Wagner.
 À Secretaria da Segurança Pública do Estado da Bahia.
 Ao Ministério Público do Estado da Bahia.
 À Defensoria Pública do Estado da Bahia.
 À Sociedade Baiana.
  A
 reportagem "Chororô na delegacia: acusado de estupro alega inocência", 
produzida pelo programa "Brasil Urgente Bahia" e reprisada nacionalmente
 na emissora Band, provoca a indignação dos jornalistas abaixo-assinados
 e motiva questionamentos sobre a conivência do Estado com repórteres 
antiéticos, que têm livre acesso a delegacias para violentar os direitos
 individuais dos presos, quando não transmitem (com truculência e 
sensacionalismo) as ações policiais em bairros populares da região 
metropolitana de Salvador.
 A
 reportagem de Mirella Cunha, no interior da 12ª Delegacia de Itapoã, e 
os comentários do apresentador Uziel Bueno, no estúdio da Band, afrontam
 o artigo 5º da Constituição Federal: "É assegurado aos presos o 
respeito à integridade física e moral". E não faz mal reafirmar que a 
República Federativa do Brasil tem entre seus fundamentos "a dignidade 
da pessoa humana". Apesar do clima de barbárie num conjunto apodrecido 
de programas policialescos, na Bahia e no Brasil, os direitos 
constitucionais são aplicáveis, inclusive aos suspeitos de crimes 
tipificados pelo Código Penal.
 Sob
 a custódia do Estado, acusados de crimes são jogados à sanha de 
jornalistas ou pseudojornalistas de microfone à mão, em escandalosa 
parceria com agentes policiais, que permitem interrogatórios ilegais e 
autoritários, como o de que foi vítima o acusado de estupro Paulo 
Sérgio, escarnecido por não saber o que é um exame de próstata, o que 
deveria envergonhar mais profundamente o Estado e a própria mídia, as 
peças essenciais para a educação do povo brasileiro.
 Deve-se
 lembrar também que pelo artigo 6º do Código de Ética dos Jornalistas 
Brasileiros, "é dever do jornalista: opor-se ao arbítrio, ao 
autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na
 Declaração Universal dos Direitos Humanos". O direito à liberdade de 
expressão não se sobrepõe ao direito que qualquer cidadão tem de não ser
 execrado na TV, ainda que seja suspeito de ter cometido um crime.
 O
 jornalista não pode submeter o entrevistado à humilhação pública, sob a
 justificativa de que o público aprecia esse tipo de espetáculo ou de 
que o crime supostamente cometido pelo preso o faça merecedor de 
enxovalhos. O preso tem direito também de querer falar com jornalistas, 
se esta for sua vontade. Cabe apenas ao jornalista inquirir. Não cabem 
pré-julgamentos, chacotas e ostentação lamentável de um suposto saber 
superior, nem acusações feitas aos gritos.
 É
 importante ressaltar que a responsabilidade dos abusos não é apenas dos
 repórteres, mas também dos produtores do programa, da direção da 
emissora e de seus anunciantes - e nesta última categoria se encontra o 
governo do Estado que, desta maneira, se torna patrocinador das 
arbitrariedades praticadas nestes programas. O  governo do Estado 
precisa se manifestar para pôr fim às arbitrariedades; e punir seus 
agentes que não respeitam a integridade dos presos.
 Pedimos
 ainda uma ação do Ministério Público da Bahia, que fez diversos Termos 
de Ajustamento de Conduta para diminuir as arbitrariedades dos programas
 popularescos, mas, hoje, silencia sobre os constantes abusos cometidos 
contra presos e moradores das periferias da capital baiana.
 Há
 uma evidente vinculação entre esses programas e o campo político, com 
muitos dos apresentadores buscando, posteriormente, uma carreira 
pública, sendo portanto uma ferramenta de exploração popular com claros 
fins político-eleitorais. 
 Cabe,
 por fim, à Defensoria Pública, acompanhar de perto o caso de Paulo 
Sérgio, previamente julgado por parcela da mídia como "estuprador", e 
certificar-se da sua integridade física. A integridade moral já está 
arranhada.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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