
A mudança do ministro Luiz Fux para a Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) pode dar mais força ao ministro Kassio Nunes Marques em um colegiado dominado nos últimos anos pelo decano do tribunal, o ministro Gilmar Mendes.
Indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para o Supremo, Nunes
Marques não se alinhou a nenhuma das correntes da corte. Sua atuação é
comparada a um pêndulo: ora vota com André Mendonça, ora forma maioria
com Gilmar e Dias Toffoli.
A posição de Nunes Marques na Segunda
Turma deve garantir a ele o voto decisivo em julgamentos no Supremo e
colocá-lo como peça-chave para a nova relação de forças do tribunal.
A
Segunda Turma do Supremo é composta pelos ministros Gilmar Mendes
(presidente), Dias Toffoli, Luiz Fux, André Mendonça e Kassio Nunes
Marques. O colegiado é conhecido por ser o mais garantista do tribunal,
corrente que prioriza a proteção dos direitos fundamentais e as
garantias individuais em detrimento do poder persecutório do Estado.
Um
eventual alinhamento de Nunes Marques com Fux e Mendonça pode garantir
maioria na turma e dar ao trio um poder até então considerado pouco
provável, diante das derrotas deles em processos julgados no plenário do
Supremo.
A Segunda Turma é a responsável por julgar os processos
ligados às fraudes do INSS, analisa casos sobre desvio de emendas e
será a responsável por decidir sobre possíveis revisões criminais de
Bolsonaro e dos demais condenados pela trama golpista.
Foi lá
também que muitas das decisões da Lava Jato foram revistas e derrubadas
com discursos contundentes contra a atuação do Ministério Público ou das
instâncias inferiores.
Quatro ministros ouvidos pela Folha
destacam que os integrantes do tribunal não costumam ter alinhamentos
automáticos. Eles divergem sobre os impactos da ida de Fux à Segunda
Turma —um acha cedo para avaliar e outros veem implicações especialmente
em matérias criminais.
Na visão de um magistrado, no entanto, a mudança deve ressaltar as diferenças entre os dois colegiados em diferentes temas.
Nunes
Marques costuma votar contra o Ministério Público em processos que
envolvem políticos ou possuem grande repercussão nacional. Foi com o
voto dele que a turma considerou ilegal o uso de relatórios de
inteligência do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) na
denúncia das rachadinhas do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
Ele
foi um dos poucos a votar pela absolvição dos bolsonaristas presos em
frente ao QG do Exército no dia seguinte aos ataques às sedes dos
Poderes.
Foi também de Nunes Marques o voto decisivo para a
Segunda Turma anular as condenações do ex-ministro Antonio Palocci,
braço direito de Lula (PT) no primeiro mandato na Presidência, preso na
Operação Lava Jato.
Luiz Fux decidiu deixar a Primeira Turma do
STF após se ver isolado no colegiado. Ele foi o único a votar pela
absolvição de Bolsonaro e parte dos envolvidos na tentativa de golpe de
Estado do fim de 2022.
Desde então, o ambiente entre os ministros ficou mais denso.
A turma é composta por Flávio Dino (presidente), Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin.
O
movimento foi interpretado por colegas de Supremo como uma tentativa de
Fux de buscar aliados num momento em que se viu acuado pelas críticas
que recebeu por seu voto para absolver Bolsonaro.
A posição de
Fux já era esperada pelos demais integrantes da Primeira Turma. O
principal motivo de indignação foi pela forma como o voto foi
apresentado, durante leitura de cerca de 13 horas sem permissão para
interrupção dos colegas.
Ainda que a divergência fosse prevista,
os ministros ficaram incomodados com a postura que entenderam agressiva
de Fux e o conteúdo que teria ido além do que Fux indicava nos casos de 8
de Janeiro, ao fazer questionamentos à condução do caso por Moraes e
referências críticas às manifestações dos colegas, além de minimizar o
caso em debate com afirmações em defesa da liberdade de expressão e
manifestação e protestos pacíficos.
No dia seguinte ao seu voto,
Moraes, Cármen e Dino dedicaram parte da sessão para rebater as teses de
Fux e defender a condenação do ex-presidente e seus aliados.
Agora
com assento em outro andar do Supremo, Fux vai dividir espaço com o
ministro Gilmar Mendes, com quem acumula desavenças. A mais recente foi
uma discussão, na quarta-feira (15), no intervalo da sessão plenária.
O
motivo do entrevero foi o pedido de vista (mais tempo para análise) de
Fux que interrompeu um julgamento de processo que Gilmar move contra o
senador Sergio Moro (União Brasil-PR) por calúnia.
O resultado
parcial era de 4 a 0 contra o recurso de Moro. Só faltava o voto de Fux.
Na discussão, Gilmar sugeriu que o colega fizesse "um tratamento de
terapia para se livrar da Lava Jato", como mostrou a colunista Mônica
Bergamo.
Na Segunda Turma, Fux pode herdar a relatoria dos
processos restantes da Lava Jato. O ministro Edson Fachin era o
responsável pelos casos, mas deixou-os ao assumir a presidência do
Supremo.
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